domingo, 29 de maio de 2011

Hipermúsica: a Planimetria como técnica hipersígnica de composição musical



Villafranca e Koellreutter segurando a partitura planimétrica e esférica de Acronon

Há alguns anos, entre 1996 e 2005, tive o prazer de compartilhar experiências musicais com o meu mestre Koellreutter e executar ao lado de Sérgio Villafranca (meu outro mestre), essas experiências foram cruciais para o futuro de minha produção artística. Inicialmente segui uma linha dodecafônica neoclássica, e logo depois somei a música serial neoclássica com conceitos de atemporalidade do mestre o que resultou em algumas obras, e finalmente introduzi os ritmos brasileiros. Depois da morte do professor e a falta de contato com Vilafranca a minha obra foi se transformando, sempre em busca de um sentido e de algo que retratasse a minha realidade como músico brasileiro amante de chorinho, música contemporânea e erudita tradicional. Uma dessas transformações veio depois que passei a usar unicamente o computador para escrever, senti dificuldades para escrever a música gráfica, e o resultado foi uma mudança na produção de música gráfica e adaptação, uma certa preferência pelo poliestilismo e neotonalidade. Porém, recentemente com o acesso continuo à internet, venho desenvolvendo música eletrônica e espectral com vozes e vídeos da internet buscando expressar o meio digital e com textos venho desenvolvendo há 4 anos a ideia dos interlinks em texto, ou como costumo chamar "texto em box", onde tento criar um espaço tridimensional para o texto por meio de janelas que dialogam histórias interligadas. Assim tenho lido inúmeros textos, teses e dissertações sobre a música e arte do século XX e XXI, são pesquisas importantes para entender e "determinar" o futuro da música e poesia que farei, e isso se faz necessário a qualquer artista, pois nesse século as manifestações artísticas tem sido amplas e complexas. Dessas pesquisas ainda colhi pouco, mas espero obter bons resultados.

Para finalizar, compartilho uma das minhas pesquisas eletrônicas, o fantástico artigo do Mestre Eufrasio Prates, músico e professor que tem contribuído para a investigação da música contemporânea.


Eufrasio Prates

Texto a ser apresentado no
IV Congresso Internacional Latino-Americano de Semiótica (La Coruña-Espanha 1999)
Abstract: As últimas mudanças paradigmáticas deste fim de milênio nos levaram a uma visão de mundo mais complexa, bem representada pela lógica hipertextual de representação sígnica. O presente artigo pretende mostrar como a Planimetria – nova linguagem gráfica de composição musical criada por H. J. Koellreutter para atender à sua "estética do impreciso e do paradoxal" – reúne as qualidades essenciais requeridas para produzir "hipermúsica", isto é, música baseada numa lógica não-linear.

O século XX se apresenta, na história conhecida da música ocidental, como o de maior complexidade. Seus inícios preludiam um movimento de transcendência dos valores dualistas da modernidade em direção a outros mais abrangentes e difusos, o que explica o solo propício à germinação da crítica e do experimentalismo. Como afirma Merrell, consciente da dificuldade em escapar às descrições reducionistas que contrapõem a tradição cartesiana-newtoniana ao presente século, "pós-modernismo e pós-modernidade são uma atitude em direção a nossa radicalmente transiente cultura contemporânea" (1995:4).
A Relatividade de Einstein, a Incerteza de Heisenberg e o Efeito Borboleta da Ciência do Caos são grandes contrapontos à visão clássica newtoniana que muitos - não apenas na física, mas também na arte, na filosofia e em todos os campos do saber - buscam transcender. É no meio desse turbilhão de novos conceitos, modelos e teorias que uma nova concepção de mundo se divisa no horizonte. Transformação é, em suma, o principal fenômeno de constituição dos novos sentidos desse mundo. Nele se desenvolveram, no âmbito musical, o dodecafonismo, o aleatorismo, a música concreta, eletroacústica, eletrônica, o serialismo integral e, dentre inúmeras correntes de criação extremamente diversificadas, a música de improvisação.
Essa diversidade, entretanto, não esconde uma característica comum à música contemporânea: a enfática preocupação com o método de composição e, por conseguinte, com a linguagem musical. Ainda que a música faça eventual uso da linguagem textual, sabe-se que suas estruturas repousam sobre códigos característicos e próprios, que variam ao longo do tempo e do espaço. A compreensão da estruturação da música do século XX passa assim, forçosamente, pela compreensão dos sistemas de linguagem em que se fundamentam. E para compreendê-los sem cair numa abordagem tecnicista e reducionista, é imprescindível a consideração de suas intenções expressivas assim como do contexto em que se inserem.

Da física quântica ao hipertexto pela semiótica

As novas formas de composição desenvolvidas ao longo desse século apresentam relações profundas com os conceitos paradigmáticos surgidos na física quântica, dos quais destacamos a relatividade do tempo (ou atemporalidade), a imprevisibilidade (ou acausalidade), a holonomia (implicação do todo na parte), a multidimensionalidade (ou interpenetração gestáltica no espaço-tempo) e a paradoxalidade (Prates, 1997:64).
Os fenômenos, segundo essa nova concepção de mundo, não podem ser reduzidos a dimensões isoladas ou à linearidade causal e determinística da visão newtoniana. A lógica subjacente à visão pós-moderna não se restringe ao princípio aristotélico de não-contradição, às proposições escolásticas e ainda menos ao rigor positivista do final do século XIX. Aproxima-se mais, na verdade, do que propunha Peirce ao falar de lógica como semiótica, utilizando os termos indistintamente. Se toda produção de conhecimento sobre o mundo se dá a partir de signos, de fato a semiótica adequa-se bastante à compreensão desse mundo. E se a "semiótica é conhecimento sobre semiose" (Deely, 1990:105), essa compreensão será maior na exata medida em que a complexidade do conceito de semiose se aproxime da própria complexidade da realidade.
Ainda que o termo semiose tenha sido usado na época de Cícero - já com o significado de "ação sígnica" - Peirce vai explorá-lo com maior profundidade, demonstrando que o processo por ele descrito exclui as ações comuns entre apenas duas partes. Para que ocorra a semiose é preciso que ocorra "uma ação ou influência que é, ou envolve, a cooperação de três sujeitos, tais como o signo (representamen), seu objeto e seu interpretante" (Peirce, CP:5.484). Sendo um fenômeno complexo que media e permite a relação de interpretantes com aquilo que percebem como realidade, a gênese de um sujeito interpretante interdepende da gênese da auto e da heteroconsciência desse mesmo sujeito. Em suma, longe de ser uma abstração que reduz a realidade a sistemas lineares, ordenados e causais, a semiose configura-se como fenômeno infinito, caótico, não-linear e, portanto, complexo em sua simplicidade cotidiana e inevitável. Daí sua maior adequação à análise e compreensão do que coletivamente supomos ser a realidade.
Porém, se a semiose tem a idade do mundo e o conceito de semiose remonta à antigüidade romana, o mesmo não ocorre com a capacidade técnica de representar o conhecimento humano em formas complexas. A fala, a escrita, os rituais ou as artes passaram por milênios até que, na segunda metade do século XX, pudessem dispor de meios que superam os limites da linearidade discursivo-racionalista: os hipertextos. Não se trata aqui de endeusar as novas tecnologias responsáveis pela criação do ciberespaço. Ao contrário, pressuponho que o surgimento de tais tecnologias dependeu intrinsecamente da emergência e consolidação daqueles conceitos duramente defendidos pelos pesquisadores pioneiros do início do século. Sabe-se que os microchips e computadores, por exemplo, não existiriam não fosse o avanço da paradoxal física das subpartículas.
Na verdade, ainda mais importante que os desenvolvimentos técnicos da física foram os conceitos de incerteza, imprevisibilidade e das conexões não-locais, que permitiram técnica e ideologicamente a realização de pesquisas que resultaram no amplo desenvolvimento das telecomunicações e da informática. Assim é que se construiu, em poucas décadas, o espaço e as técnicas hipertextuais de representação do conhecimento, hoje bastante conhecidos por causa da Internet.
O conceito de hipertexto, por sua vez, é espantosamente simples: trata-se de um texto que pode ser percorrido de diversas formas, não contendo a priori princípio ou fim. Um hipertexto contém termos-chave que funcionam como conexões para saltar de um ponto a outro, os assim chamados hiperlinks. Na lógica de navegação de um hipertexto está contido o princípio segundo o qual o leitor define, ativamente, o seu caminho individual, construindo em conjunto com o autor a sua versão própria do texto. É claro que o próprio processo de interpretação de um texto sempre permitiu um certo grau de liberdade criativa ao leitor, o que foi explorado por Mallarmé e James Joyce muito antes da invenção dos computadores. Outro exemplo, da primeira metade do século, é o poema dadaísta, resultante do recorte aleatório de palavras num jornal, de sua posterior mistura num saco de papel e, por fim, da retirada das palavras uma a uma. Estes e muitos outros exemplos evidenciam a preocupação, consciente e deliberada ou não, dos artistas em desenvolver métodos e linguagens nos quais a participação do fruidor seja enriquecida e valorizada.

Koellreutter e a Planimetria

A defesa de uma concepção de mundo onde a complexidade aproxima sujeito e realidade mostra-se, por si só, cativante. Some-se a ela o evidente caráter político-ideológico desse tipo de iniciativa e compreender-se-á melhor sua relevância e necessidade. Especialmente numa época quando o uso do poder e da tecnologia mantêm-se focados na concentração de riqueza, belicosidade e dominação da natureza, a despeito dos enormes males que essa política impõe à sociedade e ao meio ambiente. Considerando-se que uma das principais funções da arte seja a de expressar idéias e sentimentos fundamentais para o ser humano, diversos artistas abraçaram a defesa de ideais que bem se representam nos conceitos modelares da pós-modernidade.
Muitos desses artistas, é preciso que se diga, falharam em tal empreitada. A razão mais freqüente - e esta é uma dificuldade que ainda enfrentaremos por algum tempo - é a dificuldade em se expressar através de códigos ainda mais complexos que os do romantismo, especialmente para um público fruidor doutrinado e alienado pela mídia de massa (Prates, 1998:39). Num contexto como esse, a exigência sobre a criatividade do artista é altíssima já que não basta inovar no que é dito mas, complementarmente, na forma de estruturar o discurso.
É nesse ponto que chamo a atenção para a proposta do compositor H. J. Koellreutter. Nascido na Alemanha em 1915, radicou-se no Brasil em 1937 após ter sido perseguido pelo nazismo. Sua formação estética expressionista facultou-lhe a introdução do dodecafonismo no cenário local. Após o término da segunda guerra, foi convidado para desempenhar o cargo de diretor do Instituto Goethe em Nova Delhi e Tóquio. Residir no Japão e na Índia e viajar por diversos outros países orientais resultou em profundas mudanças em sua estética. Retornando ao Brasil no início da década de sessenta, o compositor encontrou tempo e terreno fértil para o desenvolvimento de uma nova técnica que, simultaneamente, permitisse reunir os conceitos apreendidos na filosofia e estética orientais, na filosofia da física moderna e na estética ocidental contemporânea. Tudo isso, é claro, temperado pelo que Koellreutter costuma chamar de caldeirão cultural brasileiro e regado a uma boa "pinguinha" (aguardente de cana brasileira). Já com 55 anos de idade, ao compor a obra Acronon, decidiu rasgar todas as suas obras anteriores. Daquele ano de 1970 até hoje, o compositor tem se dedicado a aprimorar a Planimetria.
Pode-se classificar a Planimetria entre as técnicas contemporâneas de improvisação apoiadas em notação gráfica. Essas técnicas foram desenvolvidas com o objetivo de incrementar a participação do intérprete no processo de criação musical. A tradicional liberdade do intérprete, que se situava no âmbito sutil e limitado das intensidades e andamentos, passa assim a uma dimensão jamais antes encontrada na história da música. Cage e Stockhausen encontram-se entre os primeiros músicos a inserir grafismos para estimular a realização de sons mais imprevisíveis em suas obras de meados desse século. Franco Donatoni, Morton Feldman, Earle Brown e Joachim Hespos são nomes importantes que deram seguimento ao desenvolvimento da improvisação sobre gráficos. Ver-se-á, no entanto, que as semelhanças com qualquer outra técnica conhecida de composição termina aí.
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"Estudo para José Eduardo Martins" (1991) de H.J. Koellreutter.
A base de uma obra planimétrica é um grande círculo, onde se situam os signos musicais. A escolha de uma figura paradoxalmente limitada e infinita não foi gratuita. Sabe-se, por um lado, que o círculo é visto no Oriente como símbolo de universalidade, perfeição, unidade e completude. Por outro, muitos físicos e astrônomos defendem que o universo é infinito, mas tem fronteiras, o que explicaria a expansão averiguada pelo efeito Doppler-Fizeau. O diagrama K, nome com que ficou conhecida a partitura planimétrica, inscreve-se num círculo para que possa ser girado, alterando a forma dos signos que o compõem.
A cada interpretação da obra é facultado ao intérprete escolher a posição do diagrama. Já que há uma relação entre a altura dos signos no gráfico e a altura das notas que eles representam, conforme se gira o círculo, alteram-se sensivelmente essas relações. Como se pode perceber, os signos do diagrama indicam assim sons mais graves ou mais agudos apenas na relação com os demais. Esse é outro reflexo de um pensar onde as relações são mais importantes que os objetos, como evidenciou a física quântico-relativística e os diagramas de Feynman e da Matriz de Espalhamento de Heisenberg, aos quais se assemelha, nesse sentido, o diagrama K. Note-se aqui, também, a primeira grande relação entre a música planimétrica e os hipertextos: a priori eles não têm um início ou fim predeterminados. Por serem estruturas holonômicas - isto é, nas quais cada parte representa de forma eqüitativa o todo - pode-se iniciar a leitura em qualquer ponto e terminá-la por interrupção, dependendo do vontade do leitor.
Existem três tipos de signos musicais grafados no diagrama: quadrados, triângulos e círculos. Geralmente os círculos representam um som isolado, os triângulos, dois ou três sons simultâneos e os quadrados, quatro ou mais sons. Assim, o intérprete tem liberdade de escolher as notas que formarão não obrigatoriamente acordes, mas blocos de sons ou simultanóides, como os chama Koellreutter. Percebe-se aqui a ausência de privilégios para a consonância, a harmonia ou a melodia tonais, elementos típicos da composição tradicional. Eles não desaparecem, mas dão lugar a relações mais equilibradas com seus opostos, com os quais podem se complementar. E se a semiose nos recorda a necessidade de uma terceira parte, esta certamente é o interpretante, responsável por essa reunião. A não-linearidade e complementaridade da música planimétrica novamente se aparenta fortemente à riqueza potencial dos hipertextos.
Os signos do diagrama estão ligados entre si através de linhas de percurso, indicando as possibilidades de encadeamento dos mesmos. Na bula da partitura, o intérprete é orientado para o número mínimo e máximo de sons a selecionar a cada conjunto sucessivo de sons, de modo a formar uma gestalte. As opções de passagem de um signo a outro são equivalentes à escolha de uma palavra-chave num hipertexto, mudando imprevistamente de um ponto do todo para outro qualquer. Com isso, desaparece a típica causalidade de uma linha melódica tradicional - onde o uso de um sétimo grau gera a tensão que, previsivelmente, se resolverá no tom fundamental. Ao se realizar a abertura a acontecimentos imprevistos para todos os participantes do evento, constitui-se uma obra acausal composta de signos cujo comportamento probabilístico assemelha-se ao das partículas subatômicas e de uma navegação hipertextual. Assim como as histórias e fenômenos não ocorrem linearmente na natureza, originariamente imprecisa e paradoxal.
No diagrama K, cada sucessão completa de sons, isto é, cada gestalte, deve ser separada da anterior e da posterior por um silêncio longo. Além disso, ao lado de cada linha de percurso encontram-se dois números. O primeiro indica, em tempos (pulsos) livremente contados pelo intérprete, a duração do signo musical tocado. O segundo, a duração do silêncio que obrigatoriamente segue aquele som. O efeito de rarefação resultante é bastante característico das obras planimétricas. Segundo depoimento do compositor, esse efeito derivou-se de sua observação da renda trançada por mulheres nordestinas. A beleza da renda não se encontra no tecido, mas na relação figura/fundo resultante de sua colocação sobre uma superfície contrastante. Dessa forma, a diafaneidade da Planimetria vem do jogo entre o som e o silêncio. Para reforçar o caráter equilibrado da presença desses dois elementos compositivos, o autor propõe em alguns casos a versão negativa da obra, invertendo as durações de som e de silêncio. Essa ausência de hierarquia e de referenciais fixos é reflexo da concepção holonômica da obra que, como a renda e o hipertexto, é uma rede de nós.
Quanto ao andamento, que é sugerido de forma imprecisa, deve resultar sempre de tempos que o intérprete conta de forma livre. Tipicamente são solicitados andamentos lentos ou rápidos, sem a rigidez das indicações que precisam o número de semínimas por minuto. A idéia subjacente resgata a época em que os músicos intérpretes tinham a liberdade de regular a velocidade e a intensidade da música que produziam conforme a necessidade expressiva e as expectativas do público. Assim também se vê ocorrer com os hipertextos, que se submetem totalmente ao ritmo e grau de profundidade do público leitor. A intersemiose do intérprete musical, assim como a de quem transforma um texto em hipertexto, funciona como o declamador de uma poesia, que transforma signos gráficos em sons plenos de sentido para aqueles que se dispuserem a interpretá-los segundo sua própria experiência.
Em suma, a música planimétrica, assim como o hipertexto, é holonômica, paradoxal, imprecisa, acausal, diáfana e reticular, podendo adequadamente ser classificada como uma hipermúsica que a cada hiperlink pode inaugurar múltiplos mundos de novas semioses e interpretações.

Questões finais

Pode-se afirmar, sem juízo de valor, que a música de vanguarda em geral impõe algumas barreiras ao ouvinte leigo em função da complexidade de sua linguagem. A principal razão para essa dificuldade encontra-se na própria abertura simbólica desse tipo de obra. Estamos habituados a receber informações simplificadas, reduzidas, mastigadas, valendo sempre que possível a lei do menor esforço. Pesquisas de mercado orientam, sempre pela média estatística da maioria, o ponto de corte para a produção deliberada da mediocridade cultural. Quando muito, o leigo eventualmente freqüenta concertos de música clássica nos quais o instrumentista ou o regente tem o trabalho de estudar a obra e o contexto para apresentá-los no programa, como orientações para a fruição. A passividade desse ouvinte é tão grande quanto a redundância do espetáculo.
Na música de vanguarda, ao contrário, não há almoço grátis ou pesquisas mercadológicas. E na planimétrica, menos ainda. Não há aí, é claro, nenhuma intenção pernóstica ou elitista. O que ocorre é que uma obra contemporânea está fundamentada na participação ativa do intérprete e do público, interpretantes ativos como co-autores da música planimétrica, obra incompleta por natureza. Daí o velho dilema quanto às questões comunicacionais da arte pós-moderna e o aprofundamento do abismo que a separa dos grandes públicos. Abre-se, entretanto, uma porta interessante com o crescimento da Internet e do uso dos hipertextos. Teremos finalmente agora, na virada de mais um milênio, uma oportunidade para disseminar amplamente as linguagens mais complexas? Se essa questão é de difícil resposta, outras surgem em função das assombrosamente fortes relações aqui traçadas entre a planimetria, os hipertextos e a física contemporânea:
Teria a planimetria, avant la lètre, prenunciado o desenvolvimento dos hipertextos? Seria Koellreutter um profundo conhecedor de física quântica que teria intersemioticamente traduzido as mais complexas descobertas do século para a forma musical? Seriam todas essas relações um enorme conjunto de coincidências?
Parece-me que a resposta a todas essas perguntas é não. O que pode nos ajudar a compreender essas relações semiósicas é o próprio conceito de holonomia. No fundo, todos os fenômenos do mundo estão intimamente interconectados e o surgimento de um paradigma posterior ao da modernidade funciona como o ar que nos cerca: não podemos vê-lo, mas podemos senti-lo, cheirá-lo, perscrutá-lo. Mais do que isso, sem ele estaremos todos mortos.

Bibliografia


  • Deely, John. Basics of Semiotics. Bloomington & Indianapolis (IN-USA), Indiana University Press, 1990.



  • Merrell, Floyd. Semiosis in the postmodern age. West Lafayette (IN-USA), Purdue University Press, 1995.



  • Peirce, Charles S. S. The Collected Papers of Charles Sanders Peirce. Electronic edition [reproducing the Cambrige (MA-USA), Harvard University Press, Vols. I-VI 1931-1935, Vols. VII-VIII, 1958], 1994.



  • Prates, Eufrasio. Música Quântica: em torno de um paradigma holonômico in Comunicação e espaço público. Brasília: UnB-CESPE, Jan/1997, n. 1 (61-72), 1997.



  • Prates, Eufrasio. Trumbicabilidade da música de nossos dias in Pequenos Delírios. Brasília: IESB-Valci Editora, n. 1 (37-41) , 1998.




  • Sobre o autor
    Eufrasio Prates é Músico pela Faculdade de Artes Alcântara Machado e Mestre em Comunicação pela UnB-Universidade de Brasília. Professor de Estética no IESB-Instituto de Educação Superior de Brasília e na UCB-Universidade Católica de Brasília. Diretor da ABSB-Associação Brasiliense de Semiótica e Vice-coordenador do NTC-Brasília-Centro de Estudos e Pesquisas em Novas Tecnologias, Comunicação e Cultura. Membro honorário da ECODATA-Agência Brasileira de Ecologia e Tecnologia da Informação. E-mail: eufrasio@unb.br.

    Um comentário:

    Anônimo disse...

    Olá Wagner,
    muito interessante esta nova proposta de composição baseada na planimetria, o que mais me chamou a atenção, não sei se é correto, p o silêncio é muito importante para causar um certo tipo de som imperceptível e isso aguça ainda mais a audição e todos os sentidos para uma maior interpretação por parte do ouvinte.

    Gostei muito do post!

    Pena não conhecer muito deste universo musical.

    Bjokas SU :)