Talvez levasse a mesma coisa que qualquer pessoa comum nessa situação: algumas roupas, cobertor, documentos, fotos, ou seja, coisas de extrema necessidade. Mas estou certo de que me conheço muito bem e talvez não daria importância a roupas ou documentos, e sim a prioridade seria salvar minha obra de arte, seria a primeira coisa em que iria pensar. Minhas centenas de composições e escritos com certeza seriam parte deste salvamento. E o que dizer daquele meu livro quase bicentenário que pertenceu ao meu bisavô e tataravô?
Ai meu Deus! Como pude me esquecer! A minha coleção de flautas doce e minha flauta de prata que me custaram muitas horas aulas, como poderia deixá-las.
Com certeza me conheço mesmo! Não salvaria mesmo sequer um par de meias e nenhum destes pertences, inúteis para mim nesta hora, só salvaria a arte.
Falta alguma coisa? Sim.
Levaria ainda a eterna saudade do velho casarão da família,
Único do gênero,
Moldado pelo esforço de papai,
Tijolo por tijolo,
Conquista por conquista.
Levaria a nostalgia daquelas noites quentes na varanda,
A lembrança da infância,
Das fogueiras de São João,
Da pitangueira, do fogão de lenha,
Do poço e da bomba d’água,
Do sotão mal-assombrado,
Do cheiro do jardim de mamãe...
Tudo isso, com certeza, levaria na poesia dos meus versos, mas o duro seria levar tudo ao esquecimento.