O início do seculo XX caracterizou-se pelos diversos "-ismos" intitulados em seu conjunto como Vanguardas europeias. Essas correntes estéticas foram reflexos de um mundo marcado pela I Guerra e suas consequências. E como não poderia deixar de ser, Portugal (como toda a Europa) passou por dificuldades nos anos de guerra.
O Modernismo português coincidiu com as mudanças no plano econômico e social do país.
No final do século XIX, organizaram-se em Portugal os partidos Republicano e Socialista, os quais fizeram uma forte oposição ao regime monárquico português. Associado a esse clima antimonárquico, em 1890, a Inglaterra enviou um ultimato a Portugal, exigindo que o país retirasse suas tropas dos territórios situados entre Angola e Moçambique (tal procedimento atendia ao desejo expansionista inglês, que pretendia dominar completamente o território africano). O governo português, embora tentasse na época ampliar seu domínio na África, abandonou os territórios atendendo à solicitação da Inglaterra. Tal procedimento do governo gerou um grande desconforto da população portuguesa, fazendo crescer um forte desejo inflamado pela proclamação da República.
Em 1908, o rei D. Carlos e seu filho, o príncipe D. Luís Filipe, foram assassinados por um homem do povo. O trono foi assumido pelo jovem de 18 anos, D.Manuel II. Em 1910, instalou-se a República em Portugal em meio a revoltas populares, incentivadas pela desestruturação monárquica.Teófilo Braga assumiu provisoriamente o governo. A República gerou duas correntes : os saudosistas - favoráveis ao governo e adeptos do retorno ao passado glorioso de Portugal; e os integralistas - grupo de oposição ao governo e adeptos do nazismo e do fascismo emergentes respectivamente na Alemanha e na Itália.
" Nada contra a Nação, tudo pela Nação "
(Lema do Estado Novo)
Em 1926, uma revolta levou ao poder um governo de direita. Em 1932, assumiu oficialmente o governo Antônio de Oliveira Salazar, estabelecendo diretrizes do Estado Novo. Era a vitória do integralismo. A ditadura de Salazar durou ate 1974, caindo somente com a Revolução dos Cravos.
Embora tenha vencido politicamente o integralismo, o que caracterizou a literatura no período compreendido entre as duas guerras foi a tendência saudosista.
Fases e características do Modernismo português
Em 1910, surgiu a revista cultural A Águia, a qual propunha o saudosismo (retomada das tradições lusitanas) como renovação artística. Entretanto, o Modernismo português teve como marco inicial a publição da revista Orpheu, cujo primeiro numero saiu em 1915.
Os "orfistas" eram, entre outros, Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros e Ronald de Carvalho, este último brasileiro. Influenciados pelo Futurismo de Marinetti, esses escritores tinham como objetivo escandalizar a sociedade da época, e conseguiram !
A revista Orpheu não chegou ao terceiro número, uma vez que Mário de Sá-Carneiro suicidou-se em 1916, mas sua importância foi grande para a literatura portuguesa, influenciando publicações posteriores como as revistas Exílio (1916), Ícaro(1916) e Portugal Futurista (1917).
Gerações do Modernismo português
Podemos situar o Modernismo português no período entre-guerras : 1915, publicação da revista Presença; e o período que se estende de 1940 até nossos dias.
O Modernismo português é representado por três gerações :
1ª geração - o Orfismo (1915-1917)
A 1ª geração foi marcada pela influência dos manifestos de vanguardas europeias e pela publicação da revista Orpheu. Embora os autores dessa geração tenham escandalizado a sociedade portuguesa, a grande ênfase que se dá atualmente e à obra de Fernando Pessoa e seus heterônimos.
Autores : Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros, Luiz de Montalvor, Florbela Espanca e outros.
2ª geração - o Presencismo (1927-1940)
Divulgou suas propostas por meio da revista Presenca. Os artistas dessa geração defenderam uma arte desvinculada da limitação tempo-espaco (a "arte-viva") e deram continuidade as ideias do orfismo. Caracterizou essa geração a introspecção e a análise interior.
Autores : José Régio, José Rodrigues Miguéis, Branquinho da Fonseca, Miguel Torga e outros.
3ª geração - o Neo-Realismo (1940)
A 3ª geração valorizou o romance social, abandonado a anaáise psicológica. Os autores passaram a utilizar a literatura omo veículo propagador de suas ideias. O Neo-Realismo é identificado com o regionalismo brasileiro de 30.
O romance que inaugurou essa tendência foi Gaibéus, de Alves Redol.
Autores: Alves Redol, Vergílio Ferreira, Ferreira Castro e outros.
Tendências contemporâneas
No final da década de 1940, surgiu o Grupo Surrealista, o qual organizou no ano de 1949, em Lisboa, uma exposição influenciada pelo movimento surrealista francês (Andre Breton).
Após 1960, surgiu a poesia experimental e a poesia social. A prosa caracterizou-se pelo Neo-Realismo, marcado por personagens coletivos e por um intimismo intenso, sobretudo nas obras da poetisa Augustina Bessa-Luis.
A obra de Fernando Pessoa serve como referência para os autores portugueses até a atualidade.
Fernando Pessoa
"O ponto central da minha personalidade como artista é que sou um poeta dramático; tenho continuamente, em tudo quanto escrevo, a exaltação íntima do poeta e a despersonalização do dramaturgo. Vôo outro - eis tudo. "
(Frase de Fernando Pessoa, citada na obra Fernando Pessoa - poesia de todos os tempos, seleção e organização de Cleonice Berardinelli.Editora Nova Fronteira, 10ª edição, p.10, Rio de Janeiro, 1985)
Fernando Antônio Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa, a 13 de junho de 1888. Aos cinco anos, ficou órfão de pai. Dois anos depois, sua mãe casou-se novamente, desta vez com um militar que, nomeado cônsul da África, viajou para lá com toda a família. Os estudos iniciais de Fernando Pessoa foram realizados na África do Sul, respeitando-se as tradições britânicas. Em 1905, retornou a Lisboa matriculando-se no Curso Superior de Letras, o qual abandonou em seguida. Posteriormente, trabalhou como correspondente estrangeiro no jornal Comércio.
Colaborou na revista Águia na década de 1910 e tomou contato com os movimentos de vanguarda europeus. Fundou, em 1915, a revista Orpheu e intensificou sua produção literária. Suas ideias e as dos demais integrantes da revista não foram muito bem aceitas pela comunidade acadêmica na época. É tambem desse período a criação de seus heterônimos.
Devido às consequências do alcoolismo, morreu a 30 de novembro de 1935, vítima de cirrose hepática.
Os heterônimos
"Sou a cena viva onde passam vários atores representando várias peças."
(Fernando Pessoa)
Fernando Pessoa é o principal escritor do Modernismo português. O poeta era tão denso e profundo que nao se limitou a escrever somente segundo suas próprias experiências (o que já se constituiria num excepcional material), escreveu também a partir da experiência de outros. Heterônimo é a criação de um nome fictício a que o escritor atribui suas obras. Não se trata simplesmente de um pseudônimo, mas sim da criação de um outro poeta com estilo próprio e o que é mais surpreendente, de uma personalidade particular e uma biografia específica (profissão, intelectual, amores, etc).Assim, Fernando Pessoa criou vários heterônimos, entre os quais citaremos os principais : Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.
Pseudônimo : nome falso adotado por alguém a fim de ocultar-se por qualquer motivo.
Heterônimo : outro nome, imaginário, que um homem empresta a certas obras suas atribuindo a esse autor por ele criado qualidades e tendências literárias próprias, individuais e diferentes das do criador.
(Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, Editora Nova Fronteira, 1986)
Fernando Pessoa - Ortônimo
("ele mesmo")
A poesia de Fernando Pessoa ("ele mesmo") expressa saudosismo por meio da obra Mensagem (única publicada em vida), que evoca o sentimento nacionalista de um país que sonha com o grande império que um dia foi quando da época das Grandes Navegações e de Camões. É a exaltação da tradição lusitana, como se pode notar no poema a seguir :
Chuva oblíqua
Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito
E a cor das flores é transparente de as velas de grandes navios
Que largam do cais arrastando nas águas por sombra
Os vultos ao sol daquelas árvores antigas...
O porto que sonho é sombrio e pálido
E esta paisagem é cheia de sol deste lado...
Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio
E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol...
Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo...
O vulto do cais é a estrada nítida e calma
Que se levanta e se ergue como um muro,
E os navios passam por dentro dos troncos das árvores
Com uma horizontalidade vertical,
E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro...
Não sei quem me sonho...
Súbito toda a água do mar do porto é transparente
e vejo no fundo, como uma estampa enorme que lá estivesse desdobrada,
Esta paisagem toda, renque de árvore, estrada a arder em aquele porto,
E a sombra duma nau mais antiga que o porto que passa
Entre o meu sonho do porto e o meu ver esta paisagem
E chega ao pé de mim, e entra por mim dentro,
E passa para o outro lado da minha alma...
Assista também à declamação do poema Aniversário de Fernando Pessoa por Jô Soares:
http://www.youtube.com/watch?v=OnOFveF1Eb8&feature=relatedNos livros Quadras ao gosto popular e Cancioneiro, encontramos um Fernando Pessoa lírico sem perder de vista a tradiçãa lusitana. O próprio título já resgata o passado português : cancioneiro, coletâneas das cantigas trovadorescas medievais, gênero muito cultivado por Portugal nos séculos XII, XIII e XIV.
Alberto Caeiro
Alberto Caeiro da Silva nasceu a 16 de abril de 1889, em Lisboa. Órfão de pai e mãe, viveu com uma tia no campo. Morreu em 1915, vítima da tuberculose.
Caeiro é um ponto bucólico que valoriza o campo e prega a simplicidade como princípio da vida. O mundo para Caeiro era o que ele sentia e o que via, portanto vinculado aos sentidos. O poeta não enxergou o mundo num sentido metafísico, daí sua identificação com o paganismo. Leia o poema XXIV de "O guardador de rebanhos" :
XXIV
O que nós vemos das cousas são as cousas.
Por que veríamos nós uma cousa se houvesse outra?
Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
Se ver e ouvir são ver e ouvir?
Por que veríamos nós uma cousa se houvesse outra?
Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
Se ver e ouvir são ver e ouvir?
O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.
Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
E uma seqüestração na liberdade daquele convento
De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas
E as flores as penitentes convictas de um só dia,
Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelas
Nem as flores senão flores.
Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
E uma seqüestração na liberdade daquele convento
De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas
E as flores as penitentes convictas de um só dia,
Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelas
Nem as flores senão flores.
Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.
Ricardo Reis
Ricardo Reis nasceu no Porto, a 19 de setembro de 1887. Formou-se em Medicina, depois de ter estudado em colégio de jesuítas. Após a proclamação da República, em Portugal, buscou exiíio no Brasil, uma vez que era monarquista.
Ricardo Reis era um estudioso da cultura clássica, daí a valorização do paganismo e a presença, em seus poemas, da mitologia clássica. Como Alberto Caeiro, Ricardo Reis valorizou a vida no campo, no entanto Reis questionou e refletiu sobre o mundo moderno e sua desintegração e ainda valorizou o carpe diem. Leia um poema de Ricardo Reis:
Bocas roxas de vinho,
Testas brancas sob rosas,
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa;
Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses.
Antes isto que a vida
Como os homens a vivem
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas.
Só os deuses socorrem
Com seu exemplo aqueles
Que nada mais pretendem
Que ir no rio das coisas.
Álvaro de Campos
Álvaro de Campos nasceu em Tavira, extremo sul de Portugal, em 15 de outubro de 1890. Formou-se engenheiro na Escócia, entretanto não exerceu a profissão.
Campos é um poeta futurista e moderno, dessa forma valoriza a tecnologia e a velocidade. Outro traço característico de sua personalidade é o pessimismo.
Os poemas de Campos são escritos em versos livres e brancos e guardam uma constante agressividade, como se pode notar no trecho a seguir :
Ah, Onde Estou
A banalidade devorante das caras de toda a gente!
Ah, a angústia insuportável de gente!
O cansaço inconvertível de ver e ouvir!
(Murmúrio outrora de regatos próprios, de arvoredo meu.)
Queria vomitar o que vi, só da náusea de o ter visto,
Estômago da alma alvorotado de eu ser...
Estômago da alma alvorotado de eu ser...
Bibliografia:
http://www.luso-poemas.net/modules/news03/article.php?storyid=137
http://www.revista.agulha.nom.br/fp229.html
http://www.revista.agulha.nom.br/facam82.html
Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, Editora Nova Fronteira, 1985
http://www.revista.agulha.nom.br/facam82.html
Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, Editora Nova Fronteira, 1985
Edeli Barbosa 118885
Larissa M.Martins 110277
Sarah Pinheiro 111034